top of page
Foto do escritorNavarro Prado

Norma de Referência nº 08


Como é de conhecimento geral, o art. 11-B da Lei nº 11.445/2007, com redação conferida pela Lei nº 14.026/2020, estabeleceu como metas para a universalização dos serviços de saneamento básico o atendimento, até o final do ano de 2033, de 99% da população com água potável e de 90% da população com coleta e tratamento de esgotos1.


Considerando as competências descritas nos incisos IV, XII e XIII do § 1º do art. 4º-A2 da Lei nº 9.984/2000, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (“ANA”) publicou, no último dia 10 de maio, a Resolução nº 192/2024 que aprova a Norma de Referência nº 8 (“NR 8”)3, a qual estabelece aspectos a serem observados na elaboração de atos normativos e na tomada de decisões para o atingimento das metas de universalização de abastecimento de água e esgotamento sanitário.


Nesta publicação, serão avaliados (i) o âmbito de aplicação da norma; (ii) o tratamento dado à conexão dos usuários aos sistemas; (iii) as principais disposições referentes à prestação dos serviços; e (iv) os principais elementos do monitoramento das metas.


Aplicabilidade


Nos termos do seu art. 2º, a norma será aplicável: (i) às entidades reguladoras infranacionais; (ii) aos titulares dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário; (iii) à prestação direta por órgão ou entidade do titular, ao qual lei tenha atribuído competência para prestação dos serviços públicos, incluindo autarquias e empresas do titular; (iv) à prestação realizada por meio de contratos de programa firmados entre os titulares e os prestadores, diretamente, sem licitação, na vigência da Lei nº 11.107/2005; (v) à prestação realizada por meio de contratos de concessão, bem como convênios de cooperação e instrumentos congêneres firmados entre os titulares dos serviços e os prestadores, celebrados de forma direta, sem licitação, anteriormente à vigência da Lei nº 11.107/2005; e (vi) à prestação de serviços realizadas por meio de contratos de concessão celebrados mediante procedimento licitatório ou decorrentes de desestatizações, cujos editais tenham sido publicados após a vigência da NR 8.


Por outro lado, a NR 8 não se aplica automaticamente aos contratos de concessão vigentes celebrados mediante procedimento licitatório ou decorrentes de desestatizações ou cujo edital ou consulta pública tenham sido publicados antes de sua vigência. A aplicação nestas situações dependerá de acordo entre o titular e o prestador dos serviços, ouvida a entidade reguladora infranacional, assegurado o equilíbrio econômico-financeiro do contrato (art. 2º, §§ 1º e 2º).


Compreendido o âmbito de aplicação da NR 8, no tópico abaixo será abordado o tratamento dado à conexão dos usuários ao sistema.


Da conexão dos usuários ao sistema


Ponto essencial para alcance da universalização trata-se da conexão dos usuários aos sistemas de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, havendo diversas disposições sobre o tema na NR 8.


A primeira delas diz respeito ao prazo. Após a disponibilização dos serviços, a entidade reguladora infranacional ou o titular dos serviços determinará prazo não superior a 1 (um) ano para que os usuários conectem suas edificações à rede4, sendo possível a aplicação de penalidades em caso de descumprimento desse prazo (art. 12).


A segunda, se refere à obrigação de conexão dos usuários às redes disponíveis. Conforme art. 15 da NR 8, é responsabilidade do usuário solicitar ao prestador de serviços a sua conexão às redes públicas de abastecimento de água e esgotamento sanitário disponíveis. Em caso de não conexão, os usuários estarão sujeitos ao pagamento de taxas, tarifas e outros preços públicos decorrentes da disponibilização e da manutenção da infraestrutura de uso dos serviços (§ 1º do art. 15).


Além disso, uma última previsão sobre o tema que merece destaque trata-se do monitoramento dessas conexões. Nos termos do art. 17, caberá ao prestador de serviços o levantamento de informações de todas as edificações presentes na área de cobertura de seus serviços, e o respectivo repasse aos titulares e às entidades reguladoras infranacionais daquelas não conectadas à rede pública, bem como dos casos em que o prazo estabelecido para conexão for descumprido, o que possibilitará a adoção das medidas cabíveis para garantia da universalização.


Da prestação dos serviços


Outro aspecto fulcral para a universalização dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, por óbvio, é a própria prestação desses serviços. Nesse sentido, a NR 8 prevê que caberá ao prestador dos serviços atender o disposto nos contratos firmados com o titular, no plano de saneamento básico e nos normativos da entidade reguladora infranacional, instrumentos que estabelecerão as obrigações relativas à universalização (art. 16).


Para o alcance da universalização, a NR 8 prevê a possibilidade de utilização de soluções alternativas, nos casos em que não houver disponibilidade de redes públicas de abastecimento de água ou de esgotamento sanitário e desde que previsto em norma publicada pela entidade reguladora infranacional. Inclusive, a solução alternativa pode ser ofertada como serviço público, mediante cobrança do usuário, desde que o prestador se responsabilize pela adequação e manutenção da infraestrutura e pelo monitoramento do tratamento (art. 15, § 4º e art. 20, caput e § 3º)5.


Da avaliação do cumprimento das metas


A avaliação do cumprimento das obrigações pelos prestadores de serviços e, com isso, das metas de universalização estabelecidas nos contratos e planos de saneamento básico, será responsabilidade do titular e da entidade reguladora infranacional (art. 13). À entidade reguladora infranacional, caberá, especificamente, o acompanhamento da universalização através do cálculo e da avaliação dos indicadores de cobertura e de atendimento (art. 20).


Explicando melhor, o indicador de atendimento mede o percentual de domicílios residenciais ocupados atendidos com rede pública dos serviços ou com solução alternativa adequada, enquanto o indicador de cobertura mede o percentual de domicílios residenciais e não residenciais, ocupados ou não ocupados, cobertos por rede pública ou por solução alternativa adequada (conforme Anexo I).


Somente serão consideradas atingidas as metas de universalização quando (i) ambos os indicadores de cobertura e de atendimento forem iguais ou superiores a 99%, no caso do serviço de abastecimento de água (art. 26); e (ii) ambos os indicadores de cobertura e de atendimento forem iguais ou superiores a 90%, no caso do serviço de esgotamento sanitário (art. 27).


Aqui cabe uma ressalva final de que as metas de universalização deverão ser avaliadas tanto no âmbito municipal, quanto no âmbito da prestação regionalizada – quando aplicável -, de modo a garantir que mesmo neste último caso, as metas sejam também atingidas para cada Município individualmente (art. 4º)6, previsão que busca assegurar a universalização de maneira abrangente, em todos os Municípios, e não só naquelas localidades em que houver maior vantajosidade econômica.


Considerações finais


Pelo breve resumo feito acima, nota-se que a NR 8 reflete a preocupação com o atingimento das metas de universalização definidas na Lei nº 11.445/2007. Não por acaso, essa mesma lei definiu a universalização dos serviços de saneamento básico como um dos seus princípios fundamentais (art. 2º, inciso I).


A equipe da Navarro Prado, Nefussi Mandel & Santos e Silva Advogados permanecerá acompanhando o desenvolvimento do tema, monitorando não só a futuras normas que serão editadas pela ANA e pelas entidades infranacionais de regulação, como também a forma como a aferição dos indicadores ocorrerá na prática.


*O grupo de estudos sobre saneamento é composto por Ciro Thomé, Denise Nefussi Mandel, Maria Clara Fernandes Ferreira e Renata Faria.


1 Quando os estudos de modelagem para a prestação regionalizada apontarem para a inviabilidade econômico-financeira para universalização até 2033, mesmo após o agrupamento de Municípios de diferentes portes, é permita a dilação do prazo para universalização, desde que não ultrapasse 1º de janeiro de 2040 e desde que haja anuência prévia da entidade reguladora infranacional, nos termos do § 9º do art. 11-B da Lei nº 11.445/2007.   

2 Art. 4º-A. [...] § 1º Caberá à ANA estabelecer normas de referência sobre: (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) [...] 

IV - metas de universalização dos serviços públicos de saneamento básico para concessões que considerem, entre outras condições, o nível de cobertura de serviço existente, a viabilidade econômico-financeira da expansão da prestação do serviço e o número de Municípios atendidos; (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) [...] 

XII - sistema de avaliação do cumprimento de metas de ampliação e universalização da cobertura dos serviços públicos de saneamento básico; (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) 

XIII - conteúdo mínimo para a prestação universalizada e para a sustentabilidade econômico-financeira dos serviços públicos de saneamento básico. (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) 

3 A NR 8 publicada revogou a Resolução ANA nº 106/2021, antiga Norma de Referência nº 2 da ANA.  

4 Em linha com o § 6º do art. 45 da Lei nº 11.445/2007.  

5 Em linha com o § 4º do art. 11-B da Lei nº 11.445/2007, bem como com o § 11 do art. 45 da mesma Lei.  

6 Art. 24. Os indicadores de cobertura e de atendimento de abastecimento de água e esgotamento sanitário devem ser calculados e avaliados pela entidade reguladora infranacional para as seguintes áreas de abrangência da ação ou prestação: I - por município, mesmo em casos de delegação parcial e/ou de composição de conjunto de municípios sob prestação regionalizada, abrangendo todo território do município, para fins de avaliação de desempenho municipal; II - por área urbana do município para avaliação do plano de saneamento básico, no que concerne aos indicadores de atendimento; III - por área rural do município para avaliação do plano de saneamento básico e do Programa Nacional de Saneamento Rural, no que concerne aos indicadores de atendimento; IV - por contrato de prestação de serviços no município, incluindo delegação parcial, para fins de avaliação contratual; V - por prestação regionalizada, quando for o caso, para fins de avaliação de desempenho regional e avaliação contratual; e VI - por prestador de serviços, sempre que este atender a mais de um titular na área de atuação da entidade reguladora infranacional, para fins de comparação entre prestadores. 

Comments


bottom of page