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Tarifa social de água e esgoto: atribuições de atores do setor de saneamento básico na implementação da Lei Federal nº 14.898/2024

1. Introdução


A Lei Federal nº 14.898/2024 (“Lei da Tarifa Social”) foi responsável por instituir, em âmbito nacional, as diretrizes para a tarifa social de água e esgoto (“Tarifa Social”). Segundo a referida Lei, a Tarifa Social corresponderá a 50% do valor da tarifa devida à primeira faixa de consumo, aplicável aos primeiros 15 m³ consumidos por residência beneficiária (art. 6º da Lei da Tarifa Social). A Tarifa Social será aplicável aos usuários com renda per capta de até ½ salário-mínimo que (i) pertençam a família de baixa renda inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) ou no sistema cadastral que venha a sucedê-lo; ou (ii) pertençam a família que tenha, entre os seus membros, pessoa com deficiência ou pessoa idosa com 65 anos ou mais, que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família, e que receba Benefício de Prestação Continuada (art. 2º, incisos I e II da Lei da Tarifa Social).


Embora a Lei da Tarifa Social esteja em vigor desde dezembro de 2024, a sua efetiva implementação dependerá de uma série de etapas, envolvendo ações de diversos atores do setor de saneamento básico.


O objetivo deste artigo, especificamente, é abordar as atribuições conferidas à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (“ANA”), às Entidades Reguladoras Infranacionais (“ERIs”) e aos prestadores de serviços para a implementação da Tarifa Social.

 

2. Atribuições dos atores do setor de saneamento


2.1. Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA


A ANA, primeiramente, será responsável pela instituição de diretrizes para aplicação da Tarifa Social (art. 6º, caput, da Lei da Tarifa Social), bem como pela edição da norma de referência sobre estrutura tarifária que contemple a Tarifa Social (art. 7º, caput, da Lei da Tarifa Social e art. 4º-A, § 1º, inciso II, da Lei Federal 9.984/2004).


Até o momento, ainda não foram editadas normas pela ANA sobre o tema. Não obstante, em cumprimento às suas competências, a Agência já (i) disponibilizou em seu endereço eletrônico oficial espaço para fornecimento de informações sobre a implementação da Tarifa Social[1]; (ii) realizou a Tomada de Subsídios nº 005/2024 para planejamento da norma de referência sobre estrutura tarifária para os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário[2]; (iii) realizou a Tomada de Subsídios nº 002/2025 para colher contribuições sobre a Tarifa Social para elaboração da norma de referência sobre estrutura tarifária[3]; e (iv) realizou eventos relacionados ao tema, ampliando o diálogo com o setor regulado[4][5]; e (v) realizará, no próximo dia 10/04, uma oficina dedicada ao tema[6].


Para além da definição de diretrizes e publicação da norma de referência, também será competência da ANA a consolidação e a disponibilização das informações para repasse dos recursos da Conta de Universalização de Acesso à Água (art. 11, §§ 1º e 2º da Lei da Tarifa Social), bem como a divulgação, em seu sítio eletrônico, da lista positiva dos prestadores de serviços que atendem as previsões legais sobre a Tarifa Social (art. 12, parágrafo único da Lei da Tarifa Social).


Sobre esse aspecto, conforme instrução disponível nona página oficial da ANA, e conforme apresentado pela Agência no em webinar ocorrido em 13/02/2025, para avaliação do atendimento à Lei da Tarifa Social, da efetiva implementação da Tarifa Social, e para a consequente construção da lista positiva, deverão ser consideradas as seguintes fases:


“Para fins de construção e atualização da lista positiva mencionada na Lei nº 14.898/2024, considera-se o início formal de uma ou mais das seguintes etapas necessárias ao processo de implementação da Tarifa Social:


  • Solicitação formal de acesso aos dados do CadÚnico e do BPC: A ERI já realizou a solicitação formal para obtenção dos dados do Cadastro Único (CadÚnico) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), conforme previsto na legislação;

  • Processo de reequilíbrio econômico-financeiro em andamento: O processo de reequilíbrio econômico-financeiro do prestador encontra-se em curso para possibilitar a inclusão das famílias elegíveis no benefício. A ERI deve indicar a previsão de data para conclusão do processo de reequilíbrio;

  • Implementação faseada: Todos os critérios de elegibilidade da Lei já estão sendo cumpridos, mas a inclusão das famílias elegíveis está sendo feita por etapas, conforme cronograma estabelecido e divulgado pela ERI; e

  • Implementação concluída: Todas as famílias elegíveis já estão sendo beneficiadas pela Tarifa Social de Água e Esgoto, conforme estabelecido na legislação”[7].


Havendo o início formal de qualquer das etapas acima, poderá ser considerado que o prestador está cumprindo a Lei da Tarifa Social, possibilitando o seu registro na lista positiva.


O reconhecimento desse faseamento pela ANA é relevante pois compreende que o atendimento à Lei da Tarifa Social não ocorre de forma instantânea, sendo necessário o cumprimento de uma série de etapas até a sua efetiva implementação da Tarifa Social. O cumprimento dessas etapas, na prática, dependerá de medidas por parte das ERIs e dos prestadores de serviços, conforme será abordado a seguir.

 

2.2. Entidades Reguladoras Infranacionais – ERIs


Em relação às ERIs, uma primeira atribuição relevante dessas entidades será solicitar osconduzir a cessão dos dados referentes ao Cadastro Único, nos termos do Informe nº 57, de 29/10/2024, do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome[8], os quais serão imprescindíveis para o mapeamento das residências que terão direito à Tarifa Social[9].  


Para além dessa atribuição burocrática, é preciso lembrar que as ERIs competentes serão as entidades efetivamente responsáveis pela regulação dos serviços de saneamento, inclusive pela regulação tarifária, competindo-lhes a  sendo um dos objetivos desta atividade a definição de tarifas que assegurem tanto o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de prestação de serviços, quanto a modicidade tarifária, por meio de mecanismos que gerem eficiência e eficácia dos serviços e que permitam o compartilhamento dos ganhos de produtividade com os usuários (art. 22, inciso IV, da Lei Federal nº 11.445/2007).


As ERIs definirão o regime, a estrutura e os níveis tarifários, bem como os procedimentos e prazos para sua fixação, reajuste e revisão, observadas as diretrizes elaboradas pela ANA (art. 23, caput e inciso IV da Lei Federal nº 11.445/2007). Nesse sentido, a efetiva implementação da Lei da Tarifa Social, dependerá, é claro, da estrutura tarifária elaborada pelas ERIs.


Para tanto, as ERIs deverão observar, preferencialmente, a norma de referência sobre estrutura tarifária editada pela ANA. Em caso de não aderência à norma de referência em questão pela ERI, esta deverá editar normativo próprio e publicá-lo em seu sítio eletrônico (art. 7º, caput e § 1º da Lei da Tarifa Social).


À ERI competirá, ainda, a edição de ato normativo relacionado à inclusão da categoria tarifária social para aos contratos de prestação de serviços, no prazo de 24 meses, nos casos em que a referida categoria não existir (art. 7º, § 2º). Sobre esse aspecto, é importante compreender que a Lei da Tarifa Social garante aos prestadores de serviço o direito à prévia recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos seus contratos de prestação de serviços, tanto nos casos em que a Tarifa Social tiver sido instituída, quanto nos casos em que houver a sua alteração (art. 6º, § 3º e art. 8º, §§ 1º e 2º da Lei da Tarifa Social), cabendo à ERI a condução desses pleitos (art. 17 da Norma de Referência nº 6 da ANA).


Por fim, as ERIs serão responsáveis por coletar as informações necessárias para distribuição dos recursos da Conta de Universalização do Acesso à Água e por disponibilizá-las à ANA (art. 11, §§ 1º e 2º da Lei da Tarifa Social), bem como por enviar informações à ANA acerca do cumprimento da Lei da Tarifa Social pelos prestadores de serviços (art. 12, parágrafo único da Lei da Tarifa Social), podendo este último ser atestado em etapas, conforme explorado no tópico 2.1 acima, cabendo à ERI indicar para a ANA o andamento de cada fase.


Compreendidas as competências das ERIs no que se refere à implementação da Tarifa Social, a seguir serão abordadas as atribuições dos prestadores de serviços.

 

2.3. Prestadores de serviços


Os prestadores de serviços, responsáveis pelo contato direto com os usuários, terão a incumbência de classificar as unidades usuárias na categoria tarifária social, (i) conforme informações do Cadastro Único e outros bancos de dados já utilizados pelos prestadores (art. 4º da Lei da Tarifa Social), ou, nos casos em que as unidades não sejam identificadas automaticamente, (ii) conforme documentação apresentada pelos usuários que fizerem jus à tarifa social (art. 5º da Lei da Tarifa Social).


Por último, caberá aos prestadores encaminhar à ERI e às demais autoridades competentes, com periodicidade mínima anual, relatório contendo informações sobre os usuários contemplados pelo benefício da tarifa social (art. 4º, § 1º da Lei da Tarifa Social).  

 

3. Considerações finais


Para a implementação da Lei da Tarifa Social, como visto acima, serão necessárias medidas de diversos atores do setor de saneamento, tendo sido abordadas nesse artigo aquelas atribuídas à ANA, às ERIs e aos prestadores de serviços de água e esgoto.


Referidas medidas ocorrerão em etapas, de forma paulatina, e a equipe da Navarro Padro, Nefussi Mandel & Santos Silva Advogados permanecerá acompanhando de perto o tema, apresentando contribuições e incorporando as regras que vierem a ser instituídas nos projetos em que atua. 


[4] Webinário realizado em 05/12/2024 com o tema “Aspectos Regulatórios na Implementação da Lei de Tarifa Social de Água e Esgoto”. Disponível em: < https://www.youtube.com/live/r5iTsF6toQE>.

[5] Webinário realizado em 13/02/2025 com o tema “Tarifa Social de Água e Esgoto: como a ANA irá receber as informações dos prestadores que estão atendendo à Lei nº 14.898”. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=D_Jqyxpv-aQ>.

[6] Oficina “Tarifa Social de Água e Esgoto: Dados, Gestão e Implementação”. Disponível em: <https://forms.office.com/pages/responsepage.aspx?id=EkC74AuBmkaLTWZ_zRuviMDdgTMW_IpGs12Vb_nNgPRUNUFUSUpaSldPWUMzTFRaUDhLV1VPWEJSUS4u&route=shorturl

[9] Ainda não foram disponibilizadas instruções para acesso aos dados referentes ao Benefício de Prestação Continuada.

 
 
 

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